O que (não) fazer na crise da suinocultura?

Ultrapassar momentos como a suinocultura está vivendo requer muita calma, análise e ações adequadas. É algo totalmente individualizado e nosso objetivo aqui é apenas estimular a reflexão de alguns pontos, inclusive baseados em desafios que a vida, as escolhas e o acaso nos colocaram.

Alvimar Lana e Silva JallesAlvimar JallesSeguir

7 Março 2022

Os grandes desafios que a vida nos impõe são, na maioria das vezes, inesperados simplesmente porque nos preparamos para aquilo que conseguimos prever.

É assim com todas as pessoas e principalmente com os empresários que são movidos pelo “espírito animal” descrito pelo maior economista do século passado John Maynard Keynes em seu livro de 1936, Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda: “grande proporção de nossas atividades positivas depende mais de otimismo espontâneo do que de expectativas matemáticas.”

Qualquer crise, em qualquer setor, dependendo da intensidade, irá colocar os seus respectivos empresários, gestores e tomadores de decisões em situações de desafios cruciais. Alguns até de vida ou de morte das empresas.

Em situações dessa natureza é muito importante ter entendimento claro das circunstâncias que levaram o setor ao contexto de crise e o contexto próprio das empresas desafiadas, porque é apenas o autoconhecimento que permite saber o que fazer em tempos difíceis. O observador externo pode apenas sugerir, mas, quem tem condições de decidir é apenas o gestor que conhece a empresa com números próprios e verdadeiros.

Nesse ponto, vale inclusive a máxima de que o custo de produção do vizinho não serve para você.

Outro detalhe importante são as emoções envolvidas. Como decidir já está mais complexo nesse momento, pelos desafios reais, se você se deixar levar por emoções equivocadas, principalmente sobre o mercado, elas certamente te colocarão em situações ainda mais difíceis.

Junto com o conhecimento detalhado do seu custo de produção é importante juntar bons fundamentos sobre o funcionamento do capitalismo porque brigar com o mercado nunca dá bom resultado. Além dele não dar a menor bola para nossos desejos, isso servirá apenas para te aprisionar em emoções equivocadas, consumindo energia vital que você deveria estar usando para tomar as decisões certas.

A suinocultura é um sistema complexo como vários outros e que se equilibra em 6 pontos chave: instalações, nutrição, sanidade, genética, manejo e recursos humanos, incluindo nesse último tanto a equipe de trabalho quanto a administração, decisores e assistência técnica.

Costumamos dizer que esse sistema é uma caixa d`água de seis lados, e quem determina o nível da produção e da produtividade é o “lado mais baixo” porque os resultados irão “vazar por esse lado”.

E o que isso tem de relação com a crise? Simplesmente tudo!

Se você tiver conseguido construir um caixa robusto, que aguentará ultrapassar as dificuldades que não são eternas, ponto para você. Basicamente é reduzir ou zerar os investimentos, eliminar qualquer despesa que não seja indispensável e seguir fazendo o que sempre fez: cuidando da produtividade e da gestão.

E se você não tiver esse caixa robusto preparado para a crise?

Aí sim é hora de decidir como explicado acima, sem emoções erradas e com as ações fundamentadas e certas.

O primeiro passo é decidir o que pode ser cortado, economizado e o que jamais deve ser alterado.

Aí começamos a separar as escolhas que afetam o curto prazo e o longo prazo.

A suinocultura tem uma característica importante. Em situações de normalidade e lucratividade, quanto maior o peso de venda melhor pois, aumenta o faturamento e dilui os custos fixos.

Já quando temos prejuízo moderado no conjunto da atividade, geralmente a fase final de crescimento dos animais ainda ajuda a diminui-lo porque ela sozinha costuma se manter lucrativa: o que o suíno come de ração por dia, em relação ao que ele ganha de peso, ainda dá resultado positivo e colabora para atenuar o prejuízo da granja como um todo.

Mas, quando essa relação ganho de peso/preço do suíno versus consumo diário/preço da ração se inverte ela passa a “queimar o caixa” das empresas.

Se você está na categoria inicial, de quem tem recursos suficientes para ultrapassar esse momento siga. Mas, se seu caixa está fragilizado é preciso considerar abaixar os pesos de venda.

Mas isso vai aumentar meu custo operacional! E quando a suinocultura melhorar não terei animais pesados para vender!?

É isso mesmo! Mas ainda terá a granja para se recuperar ali na frente, porque se insistir na trajetória que queima seu caixa, e o tempo de duração for maior que sua capacidade de conseguir recursos para sustentar a atividade, seja através de reservas próprias ou financiamento com capital externo você poderá não mais ter a granja quando tudo melhorar.

É preferível sofrer um pouco em um momento melhor de margens positivas no futuro que não conseguir chegar lá.

Com certeza suas condições de financiamento externo serão mais fáceis se estiver com sua capacidade de produção preservada. E nós sabemos que esse financiamento se dá de várias formas, seja com dinheiro diretamente ou com condições de compra e de venda planejadas para alongamento da capacidade de caixa. Manter a viabilidade do seu negócio e o funcionamento adequado é vital para se financiar com as fontes de capital e/ou fornecedores.

E, se os recursos ficarem muito escassos, e você for forçado a comprometer os pilares que afetam o longo prazo, sua recuperação futura será ainda mais difícil. Agora entramos na reflexão do que “não fazer”.

Vamos voltar aos pilares. Passar pelos 6 pontos chaves.

A alimentação e nutrição é o mais importante dos custos. Deve ser considerada a possibilidade de ajustes para economizar nas fases finais, alinhada com a estratégia dos pesos de vendas, mas, não descuide das fases de reprodução e dos leitões de creche. Elas irão afetar os resultados em um momento que certamente o mercado estará com a oferta enxuta e melhores preços.

Recursos humanos fazem tudo. Devem ser intocáveis. Ações de contenção de despesas aí tem efeito contrário. Trarão desestímulos e prejuízos. O pilar do manejo depende de bons recursos humanos. São praticamente 2 em 1.

A sanidade é preciosa. O equilíbrio deste quesito está na base de sua recuperação no médio e longo prazo. Além de percentualmente, do ponto de vista de custos, ser bem menos impactante que outras despesas também a classifico de intocável.

Instalações podem esperar. É preciso preservar a manutenção essencial, mas, melhorias e reformas mais robustas podem ficar para momentos mais adequados do ponto vista financeiro.

Genética? Há 2 aspectos. O de longo prazo e o de curto. Não é permitido descuidar de sêmen, dos descartes e do fluxo de cruzamentos, que são garantidos por marrãs abundantes, mas, talvez um investimento mais robusto em material genético possa esperar.

Em resumo, ultrapassar momentos como a suinocultura está vivendo requer muita calma, análise e ações adequadas. É algo totalmente individualizado e nosso objetivo aqui é apenas estimular a reflexão de alguns pontos, inclusive baseados em desafios que a vida, as escolhas e o acaso nos colocaram. Jamais receitar à distância para desafios de dimensão desconhecida.

Mas algo é certo: depois da tempestade vem a bonança e nós nos encontraremos lá.