A Quaresma é um período de reflexão e penitência para os cristãos, que eventualmente abdicam do consumo de carne vermelha como forma de sacrifício. Mas qual é o impacto dessa prática nos preços das carnes no mercado brasileiro?
Quem é atento ao critério e a metodologia para produzir alguma conclusão sabe como é difícil isolar variáveis, portanto, não temos aqui a intenção de sermos taxativos sobre a afirmação ou negação da relação de causa e efeito dos fatores Quaresma e preços, mas é plenamente possível fazermos alguns exercícios baseados em dados.
Para responder a essa questão, analisamos os dados do CEPEA- Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, vinculado à Universidade de São Paulo, que acompanha os preços do suíno vivo desde 2013 em um total de 11 anos. Selecionamos três datas em cada ano: o início, o meio e o fim da Quaresma, e comparamos as variações percentuais dos preços nessas datas.
Vamos começar com os resultados para o suíno vivo em Minas Gerais como referência.
Na metade do período temos uma média de queda de -1,42% do preço inicial, sendo que em 4 anos o preço está igual, em 3 anos maior e em 4 anos está menor. Desses 4 anos de queda nenhum ficou abaixo de 90% do preço inicial.
No final do período a queda média é maior. De -9,47% do preço inicial, sendo que em 3 anos ele ficou acima e em 8 anos ficou abaixo. Dos 8 anos abaixo, em 3 ele permaneceu acima de 90% e em 5 veio abaixo de 90%. A influência negativa da Quaresma seria só na segunda metade do período? Faz sentido isso?
Vamos olhar o preço de outras carnes, começando pelo boi.
Na metade da Quaresma, a diferença média foi de crescimento de + 1,90% do preço. No final da Quaresma, o preço médio do boi cresce +2,27%. Decompondo a média encontramos o mesmo comportamento para o meio e o final do período: em 8 dos 11 anos totais o preço ficou acima de 100%, em 3 anos abaixo de 100% e nenhum deles abaixo de 90%.
Quais as pistas através do preço do frango congelado CEPEA? Em 10 anos de pesquisa (2014/2023) temos uma média de + 3,04% na metade do período e +4,31% ao final do período. Aumento como o boi. Na metade do período 7 anos maiores que 100%, 2 acima de 90% e apenas 1 abaixo de 90%. No final do período em 6 anos estamos acima de 100% do início, em 3 anos acima de 90% e novamente em apenas 1 ano abaixo de 90%.
Se é a Quaresma que altera o consumo de carne e por consequência os preços as variações não deveriam estar mais alinhadas?
Nós cremos que a Quaresma não tem nenhum efeito determinante sobre os preços das carnes no Brasil.
Uma possível sazonalidade deve vir de outros fatores que influenciam muito mais o mercado que a prática religiosa.